RÉQUIEM AO PAJADOR

Autor: Vaine Darde
Interprete: Pedro jr da Fontoura
Amadrinhador: Leonardo Charrua

Eu não direi de ti a ausência ardente,
A falta que a guitarra ainda chora,
Ocaso que ficou dentro da gente
Naquela noite triste sem aurora.
Eu só direi de ti a lira inquieta
Que o vento vem tanger nas casuarinas,
O rio que, em murmúrios, desatina
Pranteando o pajador na pampa aberta.

Todo violão se fez um ataúde...
Mas ressuscitas dessa Arcádia morta
Pra pôr cadência nas sonatas rudes
Dos que o destino não abriu a porta.
Pois te declamam, nos confins rurais,
O peão humilde pra ninar a prenda,
O piá gaúcho pra cantar legendas
E os cata-ventos pelos temporais...

Eu não direi de ti o tom agreste
Da frase simples mas enluarada
Porque, há muito, tu já te fizeste
O mago d’arte de fazer pajada.
Alguns romeiros te acendem velas
Em rezas xucras de vocabulário,
Outros se tornam teus fiéis templários
Nas pulperias onde te revelas...

Teu canto tinha vozes de ‘cordeona,
A chama bailarina do lampião,
A água borbulhante da cambona
E esporas cochichando no galpão.
Cantor das aflições dos arrabaldes,
Em tua tessitura missioneira,
Sabias dos acordes das goteiras
Cantando o vendaval dentro das baldes.

Ninguém irá herdar o teu idioma
- Rebanho que só tu apascentavas -
Em cânticos de bailes ou de domas
Detinhas o domínio da palavra.
É sempre a mesma história...
o mesmo tema...
Blasfemo te imitando o sortilégio
Chegando a cometer o sacrilégio
De ter um verso teu no meu poema.

E quando chove ausência nos meus olhos
Nas longas madrugadas da campanha,
Sozinho, co’a guitarra sobre o colo,
É sempre um verso teu que me acompanha.
Jamais existirá alguém igual,
Jamais alguém terá a tua pena,
Na eterna trajetória do poema
Nasceste para ser outro imortal!

A ausência que deixaste é ilusória...
Não sei, se por encanto ou por magia,
Agora, tu também és poesia
Translúcida em sonora trajetória.
Tamanha foi a força do teu dom
Que, mesmo, sendo a vida só um sopro...
Tu já não necessitas ter um corpo
Porque és mais um ser de luz e som.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradecemos a sua participação. Tão logo possível responderemos.
Querência da Poesia

3º Querência